domingo, 2 de junho de 2013

Ensaio

Em que dia estamos? Eu planejei tudo com detalhes e antecedência (de um dia, vai, mas planejei), e nos meus sonhos, me ocupei dos olhares, dos trejeitos, do cabelo e da maquiagem. Acordei com o barulho de que tinha chegado a hora e mais uma vez estava atrasada. Eu chego atrasada até onde não tenho que chegar a lugar nenhum. Em um momento estava no meu casulo e no seguinte, a luz entrava despojada e familiar como se fosse normal estar nesta casa, na minha vida e sobre meu corpo, que pouco à vontade, se movia quase que maquinalmente na frente de um (quase) estranho e sua estranha câmera. Eu tinha medo que eles pudessem captar a minha vergonha, a minha timidez e, sobretudo o que a luz fazia ver: que fazia tempo que eu não via a luz.
Não há muito que eu possa dizer sobre as fotos. Eu não as vi e sequer tive a curiosidade de ver. Eu só queria que servissem para algo, e o meu eu, sempre pouco estruturado para a realidade, não se importava. Mas ele é, como um poeta, um grande fingidor, finge que está tão à vontade, que chega a fingir que é estar à l’aise o que deveras sente. Evitei o máximo que pude olhar diretamente para a lente, porque meu olhar, construído em um complexo que dificilmente reparo a não ser quando congelado em uma foto, não estava ali. Eu estava olhando pra dentro, e sentia até certo prazer de não me importar em estar perfeitamente maquiada ou no ângulo correto. E dentro de mim eu vi que não havia como fugir. Não há outro lugar pra ir a não ser dentro desse corpo e movê-lo, prendê-lo ou soltá-lo, amá-lo ou odiá-lo.

Quando ele se foi, eu tirei tudo, a maquiagem, a roupa e me deitei. Dormi um sono agitado e quando acordei, tinha chorado. Uma lágrima havia escorrido dos meus olhos sem esforço, sem dor, e eu não a compreendi até esse exato momento em que escrevo. Entendi que tudo bem não gostar muito de luz. Tudo bem se sentir envergonhado, triste, sozinho ou pouco à vontade. Tudo bem. Mas naturalmente, há partes de nós mesmos que gostariam de ser vistas, olhadas e admiradas e tudo bem também mostrá-las quando vale a pena. E que no fim, está tudo bem, de verdade. Que aquele cara não ligue, que sua mãe não fale, que ainda seja noite e não haja nada pra fazer. De vez em quando, alguém aparece e diz: você topa? E você diz que sim. E fica tudo bem.  

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