Em que dia estamos? Eu planejei
tudo com detalhes e antecedência (de um dia, vai, mas planejei), e nos meus
sonhos, me ocupei dos olhares, dos trejeitos, do cabelo e da maquiagem. Acordei
com o barulho de que tinha chegado a hora e mais uma vez estava atrasada. Eu
chego atrasada até onde não tenho que chegar a lugar nenhum. Em um momento
estava no meu casulo e no seguinte, a luz entrava despojada e familiar como se
fosse normal estar nesta casa, na minha vida e sobre meu corpo, que pouco à
vontade, se movia quase que maquinalmente na frente de um (quase) estranho e
sua estranha câmera. Eu tinha medo que eles pudessem captar a minha vergonha, a
minha timidez e, sobretudo o que a luz fazia ver: que fazia tempo que eu não
via a luz.
Não há muito que eu possa dizer
sobre as fotos. Eu não as vi e sequer tive a curiosidade de ver. Eu só queria
que servissem para algo, e o meu eu, sempre pouco estruturado para a realidade,
não se importava. Mas ele é, como um poeta, um grande fingidor, finge que está tão
à vontade, que chega a fingir que é estar à
l’aise o que deveras sente. Evitei o máximo que pude olhar diretamente para
a lente, porque meu olhar, construído em um complexo que dificilmente reparo a
não ser quando congelado em uma foto, não estava ali. Eu estava olhando pra
dentro, e sentia até certo prazer de não me importar em estar perfeitamente
maquiada ou no ângulo correto. E dentro de mim eu vi que não havia como fugir.
Não há outro lugar pra ir a não ser dentro desse corpo e movê-lo, prendê-lo ou
soltá-lo, amá-lo ou odiá-lo.
Quando ele se foi, eu tirei tudo,
a maquiagem, a roupa e me deitei. Dormi um sono agitado e quando acordei, tinha
chorado. Uma lágrima havia escorrido dos meus olhos sem esforço, sem dor, e eu
não a compreendi até esse exato momento em que escrevo. Entendi que tudo bem
não gostar muito de luz. Tudo bem se sentir envergonhado, triste, sozinho ou
pouco à vontade. Tudo bem. Mas naturalmente, há partes de nós mesmos que
gostariam de ser vistas, olhadas e admiradas e tudo bem também mostrá-las quando
vale a pena. E que no fim, está tudo bem, de verdade. Que aquele cara não
ligue, que sua mãe não fale, que ainda seja noite e não haja nada pra fazer. De
vez em quando, alguém aparece e diz: você topa? E você diz que sim. E fica tudo
bem.
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