Essa carta não é pra você. Não é nem de amor, mas pode
parecer tão ridícula quanto. É um protesto, um desabafo e mais, é uma ode aos muitos
desejos que são sufocados em prol de não sei o quê e nem por quem. Seja pelo
que for, essa asfixia não deve matar esses desejos. Libertem-se. Realizem-se.
Despertem! Oh, por Deus ou por qualquer outra força que imaginem superior a
vocês mesmo, despertem! Despertem do sono artificial da rotina e do previsível.
Aconteçam nas ruas, nas mensagens de texto ou subliminares e nos olhares, em
qualquer lugar. Um dia pode parecer tão pouco, talvez amanhã, talvez nunca mais,
não vale a pena: por favor, não! Quem poderá saber menos do que está por vir do
que nós, presos ao passado, reféns de um futuro que não existe e alienados do
hoje? Até um simples pássaro, na sua humilde majestade, vive um amanhecer de
cada vez. Não faço muitas preces, mas diria uma em nome de cada momento, para
que ele não se perca; para que cada encontro não seja desprezado pela “falta de”:
falta de tempo, de utilidade, de vantagem, de coragem. E uma pra você, e pra
mim. Mais por você, pra você sempre lembrar o de sempre: que não há nunca e
muito menos sempre.
Da cor do azeviche
Amaro como a realidade e doce como a vida
quinta-feira, 6 de junho de 2013
domingo, 2 de junho de 2013
Ensaio
Em que dia estamos? Eu planejei
tudo com detalhes e antecedência (de um dia, vai, mas planejei), e nos meus
sonhos, me ocupei dos olhares, dos trejeitos, do cabelo e da maquiagem. Acordei
com o barulho de que tinha chegado a hora e mais uma vez estava atrasada. Eu
chego atrasada até onde não tenho que chegar a lugar nenhum. Em um momento
estava no meu casulo e no seguinte, a luz entrava despojada e familiar como se
fosse normal estar nesta casa, na minha vida e sobre meu corpo, que pouco à
vontade, se movia quase que maquinalmente na frente de um (quase) estranho e
sua estranha câmera. Eu tinha medo que eles pudessem captar a minha vergonha, a
minha timidez e, sobretudo o que a luz fazia ver: que fazia tempo que eu não
via a luz.
Não há muito que eu possa dizer
sobre as fotos. Eu não as vi e sequer tive a curiosidade de ver. Eu só queria
que servissem para algo, e o meu eu, sempre pouco estruturado para a realidade,
não se importava. Mas ele é, como um poeta, um grande fingidor, finge que está tão
à vontade, que chega a fingir que é estar à
l’aise o que deveras sente. Evitei o máximo que pude olhar diretamente para
a lente, porque meu olhar, construído em um complexo que dificilmente reparo a
não ser quando congelado em uma foto, não estava ali. Eu estava olhando pra
dentro, e sentia até certo prazer de não me importar em estar perfeitamente
maquiada ou no ângulo correto. E dentro de mim eu vi que não havia como fugir.
Não há outro lugar pra ir a não ser dentro desse corpo e movê-lo, prendê-lo ou
soltá-lo, amá-lo ou odiá-lo.
Quando ele se foi, eu tirei tudo,
a maquiagem, a roupa e me deitei. Dormi um sono agitado e quando acordei, tinha
chorado. Uma lágrima havia escorrido dos meus olhos sem esforço, sem dor, e eu
não a compreendi até esse exato momento em que escrevo. Entendi que tudo bem
não gostar muito de luz. Tudo bem se sentir envergonhado, triste, sozinho ou
pouco à vontade. Tudo bem. Mas naturalmente, há partes de nós mesmos que
gostariam de ser vistas, olhadas e admiradas e tudo bem também mostrá-las quando
vale a pena. E que no fim, está tudo bem, de verdade. Que aquele cara não
ligue, que sua mãe não fale, que ainda seja noite e não haja nada pra fazer. De
vez em quando, alguém aparece e diz: você topa? E você diz que sim. E fica tudo
bem.
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